Três vezes na mesma sequência. O ritmo segue e incendeia as pessoas na pequena roda. Descobre-se que um ouvinte é surdo. E mesmo assim todos dançam ao embalo dos instrumentos em frente à calçada. Como quem não escuta pode dançar tão alegremente? Os carros se amontoam por toda a via. Querem entender aquela balbúrdia, mas a bagunça faz com que ninguém pense a respeito. Somente pulam ao ritmo frenético dos instrumentos de sopro e percussão. O que pode ser? Boogie woogie? Jazz modal? Forró percussivo? Algumas pessoas começam a dançar fora do ritmo. A música desorganiza o fluxo do trânsito, desconcerta quem está passando, e contagia os maus humorados. A canção não tem letra. A música não tem uma estrutura precisa: somente explosão. O palco não existe. A luz vem do fim do dia. Só existe o som. O mesmo som que o surdo nunca vai saber qual é, mas que ele também pode sentir. Os músicos encerram a sua apresentação.
O silêncio vem na sequência entre sorrisos e momentos de despedida. Os minutos se passam lentamente. Aos poucos todos vão para as suas casas com algo guardado dentro de si. Eu trouxe comigo aquela melodia do final da canção, e ainda posso escutá-la. De repente ela desaparece. Me lembro do surdo. A noite vai começando diferente das outras. Os problemas, e até mesmo o que somos durante o dia, pode sumir por alguns instantes, mas a música acaba, e os músicos também seguem o seu caminho. A canção foi o nosso presente. Quantos souberam disso? A cidade volta ao seu ritmo de sempre. Cada um com o seu pedaço de melodia.
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