Quando trancou a porta ela foi até o olho mágico. Se lembrou
da história do analista que ao receber a ligação do cliente dizendo que ia se
matar sugeriu uma tarefa. Pediu que ele limpasse a porta do vizinho. O cara foi
lá com a vassoura e deu um limpa geral. E depois disso aparentemente se
acalmou. Talvez ele precisasse fazer alguma coisa de produtivo. Algo de bom
para alguém. Algo que confortasse a alma. Só que após sentar-se no vaso
sanitário, ela se contentou com a ideia de que o cliente precisava de uma
ordem. Talvez quando alguém queira se matar, aquela velha ordem interior esteja
invertida. Por que ele obedeceu? Talvez não fosse a sua hora. Preparou uma
carreira de cocaína média. Tampou a narina esquerda e com a direita cheirou lentamente. Na sala catou o telefone.
- Agora tá atendendo, né? Só foi mudar o número pra você
atender essa porcaria.
- O que você quer?
- Por que me tratou daquele jeito?
- Olha! Segue o seu caminho, beleza...
- Tô com o braço doendo.
- Desculpa aí. Tô mal também. Você passou a unha na minha cara. Quer o quê? Você é complicada demais.
- Não vai ficar assim, viu. Você é muito ciumento pro meu gosto. Eu só
estava conversando com aquele idiota. E você...
- Não sabia que agora pra conversar a gente precisa se esfregar.
- Você é doente, cara. Tem que fazer é um tratamento.
- Eu?
- Nunca vi tanta ignorância.
- Você é que tem que segurar a sua onda. Mas olha, chega
desse papo, não tô afim de ficar dando murro em ponta de faca.
- Tô aqui na casa da Cintia. Vem me buscar.
- Esquece.
- Não faz isso. Vamos bater um papo.
- Conversar o quê?
- Descolei um negócio pra gente.
- Ah é?!
- É! Mas é surpresa. Quando você chegar, eu te falo.
- Surpresa sua é encrenca na certa.
- Não! Pode ficar tranquilo.
- Qual o endereço?
- Você vai demorar?
- Fala logo o endereço, pô?
- Vem logo, anota aí.
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