sábado, 28 de abril de 2012

O som da turbina


Ela vinha na direção oposta da rua. Caminhava devagar com a bolsa debaixo do braço. Parecia preocupada. Até falou sozinha. Umas três ou quatro frases que dificilmente alguém ia conseguir entender. Aumentou o passo quando teve que parar por causa do carro que nesse momento surgiu no cruzamento. A mulher parecia cantar uma música, mas não devia ser porque se fosse música, os lábios teriam outra cadência. Ela falava com ela mesma. Só que agora esbanjava um pequeno sorriso. Com os olhos quase fechados, o sarcasmo tomou conta daquela risadinha maliciosa. Passou a bolsa pro outro braço, e ajeitou o cabelo. O seu andar era calmo embora estivesse tentando caminhar rápido. Depois que se aproximou do comércio virou à esquerda e sumiu. Ninguém apareceu nos minutos seguintes. Só o barulho do avião lá em cima fazendo um estrondo danado.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Ponto Fraco

"Caí em meu patético período de desligamento. Muitas vezes, diante de seres humanos bons e maus igualmente, meus sentidos simplesmente se desligam, se cansam, eu desisto. Sou educado. Balanço a cabeça. Finjo entender, porque não quero magoar ninguém. Este é o único ponto fraco que tem me levado à maioria das encrencas. Tentando ser bom com os outros, muitas vezes tenho a alma reduzida a uma espécie de pasta espiritual. Deixa pra lá. Meu cérebro se tranca. Eu escuto. Eu respondo. E eles são broncos demais para perceber que não estou mais ali". BUK

terça-feira, 24 de abril de 2012

segunda-feira, 23 de abril de 2012

A fábrica das palavras


O que vier será a primeira frase. Aí ajeita a sequência e vai conforme o passo. Dá uma olhada lá fora. Somente barulho. Não serve para o texto. Mas é um texto o que quer fazer? Então mantém o ritmo. Isso! Pode ser leve. Mas se não for, não tem problema. O leitor se interessa no início. Vai até onde achar que ele deva ir. Se achar um saco vai fazer como você: fazer outra coisa. O recado está embaixo da porta. Pronto. Agora se preocupe de menos. Alguma coisa vai pintar por aí. Você tá brincando com a minha cara, diria alguém. E o texto parece besteira. Calma. A resposta do dia: calmo, e nublado. Abril era um mês de mais sol. Não dá pra confiar. Na tela do computador nesse exato momento diz que o texto tem 141 palavras, cento e quarenta e nove até o ponto final. Talvez o leitor adore decifrar essas coisas, e vai ter a curiosidade de contar só pra ver se é verdade. Se fosse para vender palavras qual seria o preço? Por exemplo, a palavra garfo estaria valendo quanto? O palavrão seria mais caro. Mais barato seriam as palavras bonitas, as pessoas adoram palavras bonitas, então é mais fácil de vender. Dá para esvaziar o estoque mais rápido. Uma simples questão de mercado, ora. Palavras feias como bosta valeria caro, e as frases? Dava pra fazer uma pechincha. Só que frase necessita de entonação, o eu te amo, por exemplo, traria bastante problema por que se for dito de maneira chocha não chamaria muito a atenção, mas se for dito com muita convicção também não vai ser levado a sério. O negócio é fazer uma tabela de preços e começar anotar a cotação. Porra: R$ 500. Gostosinha: R$ 80. Gostosona: R$ 160. Doida da cabeça: R$ 23,95. Poderia cobrar em dólar, ou euro. Investir numa exportação pesada.  Palavras gratuitas também fariam parte do negócio. Afinal distribuir algumas pode ajudar a expandir a clientela. Vicia primeiro pra depois cobrar mais caro. Só que a fábrica de palavras só é mais uma maluquice desse texto. Texto que não deveria ter muita onda, sabe. O que vier será a primeira frase. Aí ajeita a sequência e vai conforme o passo. Dá uma olhada lá fora.

domingo, 22 de abril de 2012

Ao reduzir a marcha antes do quebra-molas


De vez em quando retomo alguns hábitos. Ler num sábado a tarde, por exemplo. Nesse último não fiz isso, mas quando decido ler alguma coisa, estico a perna deitado na cama e vou em frente. Li alguns livros do Hemingway sempre no sábado a tarde. Cai bem. Não sei por quê? Na verdade eu achava que ler era estabelecer um papo, mas não é. Ler é ouvir. Só depois quando estou fazendo outra coisa qualquer é que consigo digerir o que acabei de ler. E nem todo escritor sabe falar como nem todo leitor sabe ouvir. Ontem pensei em fazer isso novamente, retomar os livros que estão parados, mas dei mole. Depois de abastecer o carro peguei a avenida errada e ao passar pelo bar do Léo, um amigo me viu e acenou com a mão. Já em casa o celular tocou com uma intimação: “vem tomar uma cerva comigo”.  Fui pro bar e fiquei até tarde. E como sempre o papo foi bom. É verdade! Conheço gente pra caramba. Músicos, funcionários públicos, vagabundos, donos de bar, professor, professora. Cada um com seu jeito de ser. Ontem fiquei bebendo com dois amigos que são professores de Judô. Na hora me lembrei do Leminski que também foi judoca. Os caras me chamaram pra academia. “Rodrigão você tem que fazer um esporte, vem malhar com a gente”. “Nilo, a última vez que entrei numa academia pra malhar eu deveria ter uns 7 anos de idade”. “Cara, a academia tá cheia de mulher gostosa, e malhar faz bem Rodrigo.” “Só entro numa academia se lá tiver um bar”. A risada foi boa. Degustamos bem umas 15 cervas. Depois fui embora. Olhei para os livros na estante, pensei em encarar algum, mas desisti. Tô muito preguiçoso nesse mês. Na verdade meio cansado. Até esse blog está às moscas. Sai com uma menina, e era ela que pedia a cerveja ao garçom. “Pô, Rodrigo você tá aí só encostado nessa cadeira, tô sendo má companhia?”. “Que nada, adoro a sua presença, eu e que tô sendo uma má companhia, mas deixa pra lá senta aqui perto de mim”. Hoje abri um livro do Bukowski e li um trecho em que ele ia apostar nas corridas de cavalos em Água Caliente no México. E ele fazia isso sempre aos domingos, e quando voltava pra casa ficava pensando se ia achar umas duas ou três latinhas de cerveja na geladeira. É que a mulher dele poderia ter bebido todas elas, e aí já era. Bom, hoje é domingo, e tem um joguinho do campeonato carioca. Mengo X Vasco. Vai ser barra pesada. Aposto as minhas fichas no meu Mengo. Tô meio ressabiado, mas não deixo de torcer nunca. Acho que já deu pra escrever esse post. 

quinta-feira, 19 de abril de 2012

1 Bala do Filósofo

"Quão pouca coisa é necessária para a felicidade! O som de uma gaita. - Sem música a vida seria um erro. O alemão até concebe o próprio Deus prestes a cantar canções".
(Nietzsche)

Quinta Quente

Isso de querer
Ser exatamente aquilo
Que a gente é
Ainda vai 
Nos levar além
(Paulo Leminski)

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Velho Zimmerman

Jotabê Medeiros & Bob Dylan - Foto: Nana Tucci
Amanhã tem show do Bob Dylan aqui em Brasília. Ontem ele fez show no Rio de Janeiro, e na tarde de ontem deu uma volta por Copacabana. Pelo que parece ele adora caminhar sozinho por aí. Boto fé.  A letra de Tv Talkin’song mostra isso muito bem. “Certa vez em Londres eu havia saído para um passeio por um lugar chamado Hyde Park...” E hoje saiu essa matéria do JotaBê no Estadão. De início o velho Dylan não gostou muito, e já foi xingando logo de cara, mas relaxou e depois seguiu o seu rumo. Será que na tarde de amanhã o coroa vai passear na W3, ou quem sabe, lá pelas bandas do Conic? Dylan no cerrado. É isso aí! Preciso ver e ouvir o cara que me fez ler Jack Kerouac quando ainda era moleque. 
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Ao lado tem o link do blog do Jotabê
&
Pra ler a matéria (a reportagem segue também abaixo das fotos): aqui

sábado, 14 de abril de 2012

Outdoor


O telefone começa a tocar. A televisão está ligada num canal de notícias. E as notícias são as mesmas de sempre. Talvez com algumas pequenas modificações. “Com a falta de segurança já pensa em fechar o comércio”. Atento o telefone e digo alô. Era engano. A pessoa do outro lado insiste que discou corretamente. Acho engraçado. Desligo. Mudo de canal. MTV. Uma música chata aparece na tela. O clip também é chato. Aliás, se você pegar o programa errado só vai encontrar música chata. Desligo a Tv. Penso em ir pra rua. Por enquanto deixo pra mais tarde.O lance é escutar algo mais animado. Play

quinta-feira, 5 de abril de 2012

Uma quinta-feira calma

subo aos céus
pelas escadas rolantes
da rodoviária de brasília

o corpo de cristo
aqui não é pão,
é pastel de carne

o sangue de cristo
aqui não é vinho,
é caldo de cana

o padroeiro desta cidade
é dom bosco
ou é padim ciço?

(Nicolas Behr)

terça-feira, 3 de abril de 2012

Um minuto

- Se você tivesse que fazer uma frase sobre Brasília, ia ser como?
- Sei lá, não faço a mínima ideia.
- Não consegue imaginar nenhuma?
- Não.
- Pô, você tem um blog, vive escrevendo letra de música, textos, fala uma aí...
-  E pra que você quer saber disso?
- Ah! Só de brincadeira.
- Inventa você, ora. Qual seria a sua frase sobre Brasília?
- Eu que fiz essa pergunta. Você quer sair pela tangente, quer cair fora.
- Larga de ser chata.
- Tá bom, não vou encher o saco.
- Então anota.
- O quê?
- A frase, ora!
- Já pensou?
- Pensei.
- Qual é?
- A maior graça de Brasília é ter uma crise existencial.
- hahahahaha
- Gostou?
- humhum
- Fala outra?
- Cuidado com a cadeira aí.
- Não, outra frase sobre Brasília?
- A maior graça de Brasília é ter uma crise existencial.
- kkkkkkkkk
- Já chega!
- Tá bom, tá bom...

segunda-feira, 2 de abril de 2012

As letras do teclado


"Eu sempre fui criticado por meus conterrâneos por contar mentiras, por não fazer história, ou por que tudo aquilo que digo ou escrevo – dizem – nunca ocorreu. E é verdade. Para mim, o primordial é a imaginação. (...) A imaginação é infinita, não tem limites, e é preciso romper onde o círculo se fecha. Há uma porta, pode haver uma porta de saída, e por essa porta é preciso desembocar, é preciso sair. Assim aparece outra coisa que se chama intuição; a intuição leva-nos a adivinhar algo que não ocorreu, mas que está ocorrendo na escritura. Resumindo: trabalha-se com imaginação, intuição e uma verdade aparente; quando se consegue isto, então conseguiu-se a história que queríamos dar a conhecer. Creio que isso é, em princípio, a base de todo conto, de toda história que queremos contar". 

Juan Rulfo 
(Nossa América nº 3 / Ano 1992)

domingo, 1 de abril de 2012

A Procissão

Hoje é domingo de ramos. Na verdade acho que sou o mesmo moleque de sempre. Teve uma época que ia à missa com os meus pais. Ficava agoniado que terminasse logo. Não via a hora de ir embora. Ficava contando os minutos. E eu ia para não chatear os dois. Depois de um tempo deixei de ir à missa. Ainda sou católico e acredito em Deus, mas não tenho paciência em sentar num banco de igreja. Mas nessa época ia. Só que depois para compensar a minha boa ação por ter ido rezar com os meus pais, já em casa eu ficava escutando Nirvana (na época estava no auge) dentro do carro do velho. Um tempo distante, mas que ainda está comigo. E não escutava baixo não. Aumentava o som no máximo.  Quase estourando as caixas. Hoje vi umas fotos inéditas do Kurt num site de notícia e me veio essa lembrança. Então PLAY. Essa é a minha maneira de comemorar o domingo de ramos. Um dia bacana pra todos.