quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Últimas Horas


Nesses dias tenho lido vários blogs que estão no link aí do lado direito. E encontro textos, poemas ótimos. Porque foram escritos com emoção. No blog do Domingos de Oliveira, por exemplo, tem um chamado “Carta Aberta para Dani Barros”. Ela é atriz e montou uma peça em que interpreta Estamira. Pra quem nunca ouviu falar da Estamira: ela foi uma senhora que passou uns 20 anos vivendo e trabalhando no aterro sanitário de Jardim Gramacho lá no Rio de Janeiro. Em 2004 o cineasta Marcos Prado contou a sua história num documentário que recebeu diversos prêmios por todo o país. Infelizmente no ano passado ela faleceu num hospital público com infecção generalizada. Passou 2 dias na fila pra ser atendida. A humilhação já está tão rotineira que reclamar parece somente mais um lamento. A saúde pública não é, e nunca vai ser prioridade do Estado, ela só funciona como um blefe, pois enquanto se puder manter a esperança no ar, o próximo mandato já está garantido. O descaso público é terrível. E sobre a peça da Dani Barros, você já imagina o quanto deve ser forte e visceral se deparar com uma interpretação desse porte ali ao vivo e a cores. Por que no teatro o distanciamento não é tão grande como no cinema. A emoção é diferente. Você tá vendo a pessoa ali a poucos metros. Participa daquilo. O que fazer com o personagem que “agoniza” na sua frente? Se o roteiro, a produção, e o trabalho do ator estiverem em sincronia, pode saber que em questão de segundos, você embarca no que está sendo dito com passagem só de ida. Tem peças que até hoje trago comigo. Ficaram guardadas como se fossem jóias. Isso é o poder de uma obra de arte. Eu assisti esse documentário, e na época fiquei com o coração apertado. Essa peça deve ser pancada. Alguns trechos da carta do Domingos:

“Eu não vi o documentário. O amigo Prado me perdoe, não foi por falta de estima. É que eu sabia tratar-se de uma descrição profunda do sofrimento causado pelas doenças mentais e não quis passar por isso. Imaginei que seria o mesmo que ver uma sessão de tortura. Sei que dói muito ser louco, embora nunca tenha passado propriamente por isso, apenas por perto”.

Domingos de Oliveira
“Por essa razão resisti em ver o trabalho da Dani Barros. Acabei indo, sentando na primeira fila, tanta insistência dos amigos. Se não caíram as lágrimas durante a representação, não faltaram logo depois que acabou. Chorei quinze minutos”.

“O espetáculo transita todo o tempo muito perto de um sentimento que devia ser proibido na vida e na arte, que é a autopiedade. Autopiedade é feio, é ignorância: um passarinho cai do galho morto de frio sem nunca ter sentido pena de si mesmo. Pois bem, Dani caminha todo o tempo sobre o fio dessa navalha. E não cai. Não toca nunca a autopiedade. Seu sofrimento é digno, altivo, como deve ser a Arte”.

“Trata-se de um trabalho sobre a compaixão, sobre o nobre sentimento da lástima pelo sofrimento humano. As pessoas de modo geral sofrem tanto quanto podem suportar na sua humana lida. E nós outros que por vocação amamos nosso semelhante, sofremos também por não podermos evitar esse fato. A compaixão, que não é exatamente a paixão mas vem com ela, é um sentimento característico e natural do homem são. Infelizmente são poucos os sãos”.

“Não falei com Dani, que não conhecia antes, mais do que dez minutos ao terminar a sessão. Primeiro quis aconselhá-la a largar a peça. Ou pelo menos não fazê-la muitas vezes, para não passar por aquele sofrimento daquele papel muitas vezes. Logo percebi que estava dizendo uma tolice. Quando alguém alcança, falando de si mesmo, uma obra de arte, ela não dói mais! Não é mais com ele, é como se fosse com outra pessoa. Que, esta sim, sofrendo aos estertores, fala por todos, para a humanidade. No bom teatro o personagem sofre mas o ator não. O ator agradece no final, calmo, sorridente e privilegiado, a possibilidade de exercer seu ofício”.

Bonito essa parte sobre a compaixão, um assunto que, às vezes, confunde tanto a gente. Me lembrei de um texto do Mário Bortolotto em que o ator Nilson Bicudo lê numa praça pública. Aqui! Acredito que não só no bom teatro, o personagem sofre mas o ator não. Na literatura isso também acontece, tem livros que deixa a gente com um nó na garganta e aquela sensação de como o autor(a) conseguiu aquilo no papel? O Domingos de Oliveira acertou no alvo. "Quando alguém alcança, falando de si mesmo, uma obra de arte, ela não dói mais"!

Pra fechar um trechinho do poema da Camila F. que está lá no blog dela.

“eu nem esquentaria que o dia acabasse rápido
apenas pegaria o carro e dirigiria contigo bebendo do
meu lado uma garrafa de whisky ruim que a gente
roubou
eu me conformaria em levar uns tiros
se tu tirasse as balas com os dentes
e não me importaria se a porra do mundo finalmente
acabasse
eu não ia ligar se tu precisasse de um fim de semana
longe de mim
e nem que precisasse ver o último boy scout pela
centésima vez
eu te acompanharia engolindo alguma cerveja
eu me conformaria se tivessemos que queimar
alguns livros
que eu te sustentasse por um tempo só pra você ter mais
tempo
a real é que eu não me importaria com nada
se tu ficasse comigo por muito tempo”.

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Não tem nada não: ela tem razão

Vai chover! Hoje? É! Vai chover mais tarde. Dúvido. Pode botar fé que cair um pé d’água. Então já vou deixar a minha geladeira estocada. Ué! É só pegar o guarda chuva e ir no bar. Não! É melhor me prevenir. Esse negócio de sair pra comprar cerveja é um saco. Boto fé! Vai tocar violão? Vou tocar um pouquinho. E o piano? Tô brincando. Já tirei algumas músicas, tá ficando bacana. É difícil pra caralho. Hahahaha! Quando eu for na tua casa quero ver. Ah! Legal. Mais tarde vamos se a gente toma uma geladinha. Fechado minha gata! Te ligo. Tá bom, mas antes me fala uma música pra começar a sexta-feira bem, vou abrir uma cerva bem gelada agora. Entra no blog e clica no: play

terça-feira, 18 de setembro de 2012

Duas horas da tarde

Rua movimentada, e a mulher ao lado da banca de revistas fuma um cigarro sem conversar com ninguém. Enquanto ajeita a bolsa, um senhor de paletó se aproxima do orelhão caminhando um pouco inclinado pra direita.  Em frente aos jornais na lateral da banca, três desocupados conversam animadamente. Passa um ônibus, um carro, quatro motos, e é a vida nesse momento. Tão diferente de quando estamos a sós dentro de uma sala, ou no quarto, ou numa casa vazia. Alguns se sentem piores e muito mais solitários no meio da multidão. É bonito observar as pessoas enquanto caminho pelo centro comercial. Todos absortos em seus problemas. Preocupação com dinheiro. Atrasos. Desencontros. Acertos. Sorrisos. Assaltos.  Os que acreditam na grandiosidade de não chegar. Imbricados até o pescoço por razões mínimas enquanto o próximo estouro não vem, a próxima decisão não chega. Alguém deve estar se dando bem. Como são os gestos? Os desocupados dão aula, mas são inofensivos. A mulher foi embora em direção ao estacionamento. Acabou o cigarro, e já não havia motivos pra ficar ali sem fazer nada. Logo estará na avenida tendo que ficar atenta ao trânsito. E se bobear vai apertar a buzina também. Estava com vontade pronunciar: ‘dias estranhos’. Como aquela música do The doors. Como se não fosse uma frase própria. Algo que tivesse aprendido quando os sonhos já não assustavam mais. A igreja velha com o banco quebrado no meio. E o estranho é que se conseguia sentar nele por alguns uns instantes. Aquilo estava mais para enfermaria do que um santuário, tanto é que o médico se levantou e ficou de longe sem pronunciar uma palavra sequer. Bijuterias viraram brinquedos. Gargalhadas quebraram o ritmo. As crianças no chão após o reencontro triste. E aquele maldito cheiro ruim. A única descoberta que trouxe alguma veracidade foi por teimosia. Era a mesma teimosia de antigamente. Alguns minutos do outro lado queriam falar a mesma coisa, só que de forma diferente. Estava bem mais animado, tinha sexo a vontade, e com tanta fartura, duvido que as pessoas sejam tão displicentes. É por isso que a realidade é bem melhor do que qualquer sonho infantil, porque não funciona dessa maneira, a morte do cachorro depois da fuga talvez mostrasse isso, a imagem ali na sua frente agonizando, o último suspiro, e ponto. O sonho como se deve na vida, e viramos o rosto não querendo encarar porque o recado estava longe, longe do que já sei: encare só pra guardar a imagem, só pra ver até quando os avisos cheios de propósitos vão ser descartados. Outra pessoa já estava no orelhão. De chinelos e bermuda. Quando as lembranças do que restou do sonho cessaram, tive vontade de pronunciar: dias estranhos. Feito a música vinda de não sei onde. "Os dias estranhos nos encontraram". Frases incompletas servem de combustível. play

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Uma por Uma

Começou a escrever sem pontuação e num ritmo acelerado. Escrevia cada palavra que vinha na cabeça. Uma por uma. Terminou o primeiro parágrafo e leu. Estava uma porcaria. Apagou e recomeçou novamente. Depois perdeu o ritmo. O texto parecia travado. Daí não conseguiu fazer muita coisa. Talvez fosse somente um vício esse hábito de escrever. Ou um passatempo babaca. Começou a preencher a folha em branco com todos os palavrões que conhecia. Quer dizer: quis descobrir quantas palavras de baixo calão tinha no seu vocabulário. Mas que arsenal! Artilharia da pesada. Se usasse todas ao mesmo tempo poderia inaugurar um novo idioma. Teve um momento que novos palavrões começaram a surgir também. Essa foi a melhor parte, e a mais difícil. Por que poderiam não entender. Voltou a escrever os clássicos. Os velhos palavrões de sempre. E quando bateu o tédio finalizou com a frase máxima do relacionamento conturbado, aquela frase que quando dita em voz alta ameniza qualquer arranca-rabo sem solução: vai se fuder, porra! 

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Sexta-feira


Uma camionete para no sinal vermelho. No reboque carrega uma lancha encoberta por uma lona creme. Ao lado passa um mendigo empurrando um carrinho de compras cheio de quinquilharias. O calor está infernal. Rostos sem expressão se cruzam a cada minuto. Próximo do retorno, funcionários do governo cavam uma vala. E logo ali à esquerda tem um parque com uma academia comunitária. Uma menina fuma o seu baseado tranquilamente, e em seguida passa pro cara que está largado no banco. Funcionários de alguma telefônica estão na esquina do outro lado da rua. Um está na escada enquanto outro busca uma ferramenta no chão. Uma mulher desce do ônibus aparentemente sem rumo. Recebo o cumprimento de uma pessoa que nunca vi. Respondo meio sem graça. Provavelmente deve ser maluco. Três noiados caminham lentamente mais à frente. No sentido contrário aparece uma bicha com duas meninas fazendo malhação. Passam por eles. É o encontro. Tenho o pressentimento de que agora vai acontecer a trucidação. Eles não vão deixar passar barato, e vão detonar o cara. Se topam perto da quadra de futebol. A bicha passa no meio dos três. Os noiados ficam puto da vida. E começam a xingar. Chega até ser engraçada a reação dos três. Os caras ficam indignados. Procuro a camionete e o mendigo, mas cada um seguiu o seu caminho. O sol não dá trégua. Só tá faltando a caatinga. Respiro um pouco de poeira. No horizonte só se vê aquela cor cinzenta. Escuto uma freada, e o som de uma moto. Procuro o celular no bolso e vejo que esqueci em casa. Parece tudo calmo ao redor. Digo parece. Esse calor deixa a gente em órbita. Passo pela rua onde uma mulher havia se suicidado. Dou um sorriso meio que querendo espantar os pensamentos maus. Uns moleques passam de bicicleta voando à minha esquerda. É isso aí molecada! Sem curtição não há vida.  

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Zimmerman na Rolling Stone Gringa


“Essas pessoas colocaram o rótulo de Judas em mim. Judas, o nome mais odiado da história humana! Se você acha que já te colocaram um apelido ruim, tenta seguir em frente com esse peso. E por quê? Por tocar guitarra elétrica. Como se isso fosse o mesmo que trair nosso Senhor e entregá-lo para a crucificação. Todos esses desgraçados maldosos podem apodrecer no inferno”. Bob Dylan

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Aceita um café


Um amigo falava sobre a dieta enquanto bebericava o seu copo de whisky caubói. Antes me ofereceu um gole. Não era falso. Poderia beber sem nenhuma contraindicação. Mas agora, ele vai ter que andar na linha. A pressão estava tão alta que o médico disse que o seu corpo era uma bomba relógio prestes a explodir. Quando terminou a frase deu uma gargalhada, e nós todos começamos a rir. Segundo ele, a pressão agora está controlada, e não há porque dispensar o seu bom e velho whisky de guerra. Nem me lembro da última vez que tirei a pressão. Acho que a minha é baixa. Tinha tempo que não ouvia essa expressão: bomba relógio. É que a qualquer hora tudo vai pelos ares. Então quando abri o jornal ontem pela manhã quis ver a bomba relógio do dia. Abri o caderno de emprego e lá veio a primeira. Empresas estão perdendo trainnes (jovens recém-formados que recebem incentivos para ocuparem cargos importantes). A velha concorrência mostra as suas garras. O engraçado dessa história é que já tem empresa que está usando como estratégia: promover café da manhã, para que o estudante e a sua família possa conhecer a sua proposta. Imagina a cena! O cara com 20 e poucos anos de paletó e gravata, juntamente, com o papai e a mamãe numa reunião pra discutir o futuro do seu filhote no mercado de trabalho. Porra! Chegou nesse ponto. “Bom dia! Como vai o senhor?! Deseja um café? O Ricardinho tem um currículo fabuloso, senhor Braúlio. As nossas intenções são as melhores possíveis”. O que me deixa alegre é pensar que não funciona assim, conheço muita gente que investiu boa parte do seu tempo nessas grandes empresas e comeu o pão que o diabo amassou, tanto é que depois que 
saíram tiveram que procurar a justiça. Levaram uma bolada de indenização. Deve ser mais fácil seduzir os pupilos na presença dos pais e mestres. Se liga moçada! Passei pros classificados, e encontrei um anúncio que me deixou alegre. Melhorou o humor. Estava lá na parte dos acompanhantes. ADORO BEIJAR! Daí vinha todas as especificações da gata como cintura, altura, e o telefone. Ao menos, ainda existe gente que adora beijar. No caderno da cidade informava que no centro de atendimento juvenil, o antigo CAJE, mataram outro menor infrator na cela. Pegaram o cara enrolaram um pano no pescoço dele, tentaram afogar no vaso sanitário, e como não conseguiram, o enforcaram até o fim. De agora em diante vai morrer um por semana até que a instituição funcione conforme a sua nova lei interna. Pelo visto a bomba relógio já pipocou, e o meu amigo sabe das coisas. Beber whisky de procedência deve manter a pressão normal. Faz parte da dieta.

sábado, 8 de setembro de 2012

No som do rádio


"Quando eu estiver velho, tarado e gagá
Com um copo de cana eu vou lembrar
Do teu gingado, e os meus olhos vão brilhar
Blues é assim, baby"
(Cazuza)

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Nada Fazer, Nada Pensar: Só Existir

Dois sons do Donavon Frankenreiter para animar esse blog. O tempo está seco pra caramba, e o som desse grande músico cai bem. Aí vai a primeira: play E pra fechar: play