terça-feira, 31 de julho de 2012

Um minuto da sua atenção


"Nossa bagagem maltratada fora empilhada na calçada novamente; nós tínhamos mais caminhos para percorrer. Mas não importa, a estrada é a vida". 
(Jack Kerouac)

sexta-feira, 27 de julho de 2012

A Voz do Brasil


No som do carro a rádio divulgava o boletim econômico do dia. O engarrafamento estava bravo. Dá aonde vinha toda essa gente? Ou melhor: todo mundo precisava ir pra casa por esse mesmo caminho? A resposta era sim. Mudou de faixa e o fluxo piorou mais um pouco. A fila estava terrível. Apareceu um camarada lá do lado de fora vendendo água. Tá errado cara. Você tem que vender é cerveja. Vai ganhar muito mais. E de quebra já emenda um espetinho de gato. Esse kit ameniza qualquer trânsito caótico. Nesse instante o celular começou a tocar.
Oi?!
Benhê, vai demorar muito?
Pô! O engarrafamento hoje tá foda.
Sério?!
Vai demorar.
A gente tem que fazer compra! Só tem um sabonete no armário, a carne acabou, o saco de arroz tá pela metade, papel higiênico, o café também no fim, temos que comprar o feijão preto pra feijoada amanhã, comprar alguma verdura, couve, tomate, açúcar, acabou o desinfetante, só tem uma  cebola...
Oh! Quando eu chegar aí a gente vê isso!
Vou fazer uma listinha, tá?!
Tá bom. Vou desligar.
Tenta vir por outro caminho.
Vou ver.
 Quando deixou o celular no porta-luvas sentiu uma pancada forte. Um ônibus tinha arrebentado a traseira do seu carro. Mas por incrível que pareça ao mandar a cabeça no volante conseguiu escutar PERFEITAMENTE a voz da sua esposa naquele tom meloso: benhê, vai demorar muito?  

quinta-feira, 26 de julho de 2012

Caderno de Anotações


Zizek
Achei um papel no bolso da calça. Tenho esse hábito de anotar algo que me vem à cabeça e depois guardar. Nome de livro. Autor. Remédio. Mulher gostosa. O que tenho que fazer no dia. Ou pra quem ligar. Aí estou aqui pensando na anotação que deveria ter feito ontem. Sei que pensei em fazer alguma coisa, mas não me lembro o quê. E agora tem esse papel aqui no bolso da calça. Quando anotei? Boa pergunta! Ontem não foi. Já está desgastado. Deve está aí há um tempão. Não sei o que isso quer dizer. Tem só um nome: Slavoj Zizek. Venho aqui pro computador. Digito no Google – esse oráculo moderno –, e descubro de que se trata de um filósofo esloveno. Ah! Li uma matéria no jornal e fiquei de sacar melhor as ideias desse doidão. Tá explicado. Aliás, já até fiz isso. Depois preciso ler com mais calma. Alguns pontos são bons. Mas agora, vou deixar esse papel na gaveta. No dia que eu topar com ele novamente, quem sabe, eu consiga ler com mais atenção.  O que deveria ter anotado ontem a noite? Vou dar uma olhada ao redor, ver se não tem nenhum outro papel de bobeira por aí. 

sexta-feira, 20 de julho de 2012

A queda


Ainda vi o momento em que ele começou a andar descompassado. O senhor deve estar lá pela casa dos 70. Ele perdeu o equilíbrio e foi ladeira abaixo. Nem a bengala impediu a pancada no chão. Imaginei que só estivesse tentando andar mais rápido, mas na verdade ele já não comandava os seus passos. O velho já tinha perdido totalmente o equilíbrio. Estava desgovernado. Só que pra mim parecia que ele caia em câmera lenta. Aí torci para que não fosse muito grave. Que ele caísse nos arbustos. Talvez o estrago fosse menor. Faltou pouco, mas infelizmente não foi isso o que aconteceu. Atravessei a rua e fui lá ajudá-lo. Ironia. Já tinha conversado com esse velho outro dia no ponto de ônibus. Estava de ressaca quando ele puxou papo. Comentou que havia se mudado há pouco tempo aqui pra redondeza. Morava no interior. Acho que era de Minas Gerais. Não lembro direito. Me contou uma porrada de casos. Coisas habituais. Esses assuntos que estão sempre a nos azucrinar. Quando vi ele caído tentei pegar com cuidado. Levantei o coroa, e a sua mulher se aproximou brava. Começou a brigar. “Viu! Seu teimoso! Não me ouve. Eu te falei! Você viu o que aconteceu?!” O sangue desceu com gosto. E como sangrava, pô. O chão parecia uma tela do Stu Sutcliffe. Ainda não tinha olhado o estrago. Não queria. Uma mulher se aproximou. “Nossa! Tá um rasgo enorme”. Aí ele se virou, e tinha um buraco fundo acima da sobrancelha, e a sua bochecha também estava bastante inchada. A pancada teve o mesmo efeito que um murro do Mike Tyson no auge da carreira. O velho tentava se explicar pra coroa. Perguntei se alguém tinha um pano. Ela abriu a bolsa, catou um, e começou a passar no rosto dele. E cada vez que fazia isso abria mais a ferida. Não! Só coloca em cima. Não precisa ficar friccionando. Uh! Qual o telefone do SAMU? Não sei. Ninguém sabia. É sempre assim, na hora em que mais precisamos: o número do telefone é um mistério. 190 - polícia. 193 do bombeiro (não tenho certeza). Mas qual é o do SAMU? De repente apareceu um carro da polícia militar. Fiz sinal. A viatura parou. “Aí, moçada querem fazer a sua boa ação do dia? O senhor aqui tá machucado. Tem como levar ele no posto de saúde?” O motorista fez cara de poucos amigos. Decerto era a hora do lanche deles. Abri a porta do carro e chamei o senhor. Um policial sacou a arma um pouco assustado. Decerto pensou que poderia ser uma emboscada. Mas que bando de frouxos. Que medo é esse?! O policial do banco de trás se mostrou mais solícito, e começou a ajudar. Tirou uns papéis do banco. Em seguida pediu para o casal tomar cuidado com a porta. Vi quando o sangue respingou no assoalho. Agora tudo iria ficar bem. O velho estava mais firme. Alguns pontos, e mais um curativo pra sua coleção. Caramba! O motorista tinha uma cara de sofrido que só vendo. Deve ter ficado puto. Gostei daquele sangue no assoalho do carro. Quando o velho se acomodou no banco, o mesmo motora ordenou que ele ficasse de cabeça erguida. Com certeza ele não queria sujeira ali. Mandei um até logo e comecei a caminhar. Mas do nada consegui ler o seu pensamento. “Magrelo babaca!” Olhei novamente e por incrível que pareça não é que o motorista conseguiu ler o meu pensamento também. “Larga de preguiça e leva o senhor pro hospital. Seu cuzão!” Espero que quando forem lavar a viatura se lembrem de que aquele sangue foi por uma causa nobre.  Vermelho Sutcliffe.
  

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Dois Lançes


Uma passada rápida por aqui. Porém aproveito para caminhar em passos lentos. É só uma frase jogada no meio do papel. Além do resultado a informação veio errada. Como também estava errado outro fato na notícia. Decerto por desatenção. Um detalhe mal analisado leva a interpretações precipitadas. Tudo bem! Isso acontece. Mas agora é só um rabisco no papel. Disse que seria uma passagem rápida por aqui. Tchau!  

quarta-feira, 18 de julho de 2012

O Último Trago

Uma música para deixar essa quarta mais confortável. Quer dizer: começar o dia com o clima favorável. Não vejo a hora de escurecer logo. Que venha a noite minha amiga.


"Quando o sol for embora, meu amor, eu vou cair fora. Porque hoje eu vou pra rua...." PLAY

terça-feira, 17 de julho de 2012

O mundo é grande pra caramba


Vou por uma conversa no meio da rua. O primeiro e único assunto que toma conta do papo é um só: o mundo. A pessoa diz que o mundo não é mais o mesmo, e as perguntas não acabam mais. O cara esta bem furioso. Gesticula sem parar. Em seguida a mulher do lenço na cabeça concorda, e começa a mandar pau também. Eu fico de olho na menina da calça colada que está à minha esquerda. Que magia! Que sortudos são os caras do trabalho dela. Passar o dia inteiro admirando aquele monumento. “As pessoas estão muito egoístas!” “É que ninguém tem mais tempo”. “Que nada! As pessoas ficam no computador por que aprenderam a olhar só para um ponto, e outra, elas estão solitárias. Mas no fundo é por que elas não estão nem aí”. Da fúria o cara passa a angústia. A mulher do lenço na cabeça parece ter compreendido. Acho que os dois formariam um casal da pesada. Fico imaginando um olhando para o outro de frente pra televisão discutindo qual seria o melhor canal pro mundo. A menina da calça colada no rabo pega o celular e confere as horas. Obrigado mundo! Obrigado por me fazer acreditar que existem pessoas boas que querem a alegria dos outros somente com um rebolado simples e honesto. “O governo não está nem aí pra gente, olha os hospitais!” “Sabe, a corrupção ainda vai afundar esse país”. A menina da calça colada faz um sinal com a mão direita e o ônibus freia mais a frente. Ela caminha na minha direção, passa por mim, e vai embora naquele coletivo que ainda está vazio. Eu me afasto do casal mundo. Apesar das farpas, eles se entenderam bem. Sento no banco sujo, e nem me importo se vou sujar a calça. Tive a impressão de que por alguns minutos entendi o que o mundo queria me dizer.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Let's Rock!

"pra que perder tempo
desperdiçando emoções
grilar com pequenas provocações
ataco se isso for preciso
sou eu quem escolho e faço
os meus inimigos"

PLAY

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Three Amigos!

Casal Neuras - por Glauco
O Angeli e o Laerte estiveram nessa última Flip, e tem alguns trechos no youtube. Num momento eles comentam sobre o Glauco. Os três formavam os Los Três Amigos: Angel Villa, Laerton e Glauquito. Muito bacana! Aqui  



terça-feira, 10 de julho de 2012

Roubo de Energia


De um lado a parede pichada, repleta de cores fortes até o fim do muro. O beco fedia a mijo. Tinha alguns grafites mal feitos. Só que a cidade na sua parte suja parecia calma. Daria uma bela foto aquele poste da esquina. Aquele amontoado de fios lá no alto. Um vira-lata rasgou o saco de lixo no fundo do bar. Três pessoas conversavam perto do carro com a porta aberta. Tem uma hora que o frio faz a gente caminhar com as mãos nos bolsos. Faz a gente brincar com o troco de moedas no fundo da calça. Nesse lugar a feiura parece não se preocupar muito. Acho que se você fizesse um solo de trompete com a boca na saída do beco tomando a avenida mais a frente, a rua lhe agradeceria com um sorriso. Dá próxima vez vou experimentar fazer isso, colocar um jazz no fone de ouvido pra ver se vai dar certo ou não. Se você prestar atenção no muro perto de uma caixa d’água, vai descobrir que lá no cantinho mora duas corujas, e enquanto o casal não sai para o jantar: o senhor coruja, e a senhora coruja ficam de olho e quem vai, e em quem volta. Sei lá, tenho a impressão de que piscaram na minha direção.  

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Pedras Rolantes Não Criam Limo

Por.: Rodrigo Ferreira - Nanquim em papel, A4 Canson
Minha pequena homenagem aos 50 anos dos Rolling Stones. Que venha a próxima turnê. Yeah!!!! PLAY - PLAY2

quarta-feira, 4 de julho de 2012

W3 Blues

Depois que a atendente do cartório me disse que ia demorar resolvi dar uma passada na biblioteca.  A biblioteca demonstrativa de Brasília fica logo ali na 507 sul. É do lado do cartório. 5 minutos de caminhada e você tá lá. Levei um pouco mais por que o sol estava rachando. Durante um tempo da minha vida de estudante sempre me refugiei nessa biblioteca. Lá era o meu esconderijo predileto. Estudei o 2º grau no Elefante Branco, e esse colégio fica por perto também. Ainda não tinha estudado em colégio público, e estudar no Elefante Branco foi interessante. Todo ano tinha greve, e as greves duravam meses. Fiquei sem professor de química um tempão, e quando apareceu, ele só pediu um trabalhinho, e pimba! Aprovado garoto! Essas greves são bem descaradas. Os alunos se lascam e não dão um pio sequer. Todo dia tinha um carro do sindicato clamando: vamos cambada, o movimento precisa de você. Alguns idiotas acreditavam nessa lorota e iam na procissão. Eu comia um cachorro quente no baiano, e pra não ter o que fazer, ou ir pra casa resolvia caminhar lentamente até a biblioteca. De forma que fiquei ainda mais vagabundo do que sou realmente. Nisso aproveitei pra fazer a minha carteirinha, e comecei a pintar por lá sempre quando queria paz, ou simplesmente correr da encheção de saco daquele tempo: vestibular, qual carreira seguir, tirar a habilitação, exército, e mais uma porrada de coisa chata. Pegava uma baia, e esquecia do mundo. Já bem acomodado na cadeira, as minhas atividades se resumiam em treinar a assinatura, desenhar, tirar um cochilo, e depois catar algum livro na estante. Ficava horas e horas lendo e me divertindo. Quando terminou o 2º grau fui para o Objetivo na 913 sul. De volta à rotina dos colégios particulares. Deus do céu! Senti a pancada. O ritmo era diferente. Uma merda. Deu saudade das greves dos professores. Talvez eu fosse um vagabundo incorrigível.
Numa sexta-feira decidi eu mesmo fazer greve. Matei aula. E fui pra rua, comprei uma carteira de cigarros, tomei café num barzinho, e acabei na biblioteca pública da 513 sul. Tá aí um lugar aconchegante. Silencioso. E bem melhor do que qualquer sala de aula. Li o jornal. Uma notinha dizia que a UNE iria apoiar o movimento. Me lembrei do carro de som deles tocando música baiana, e aquele grande clima de Micarê Candanga. Chiclete com banana e a banda do Netinho nos altos falantes. Vamos companheiro! Resolvi parar de ler. 10 da manhã senti saudades da biblioteca demonstrativa. Estava longe pra burro, mas resolvi ir caminhando até lá. Fui pela w3 olhando as vitrines, e de vez em quando parava nas bancas de revistas, dava uma olhada naquelas gostosas das capas, e seguia adiante. Num boteco pedi uma cerveja. Depois veio mais uma e bateu a fome, almocei um belo prato feito. Li um pouco o caderno do cursinho bem devagar. Depois cai na w3 sul novamente numa caminhada tranquila até a 507. Mas agora lá estava eu novamente naquela biblioteca. Passei pela roleta. Aparentemente não tinha mudado nada. Fui até a prateleira. Queria topar com algum livro que me chamasse a atenção. Algo dos autores que aprecio. Pressenti que estava diferente. Hemingway, cadê você? Encontrei um exemplar do Borges. Peguei. Vi um livro de contos do Rubem Fonseca, também peguei. Achei um com técnicas de desenho. Peguei. Daí catei uns 8 livros. As estantes já não eram as mesmas. Elas estavam repletas de livros de direito constitucional, penal, trabalhista, livros de concurso público. Sentei numa mesa sozinho, e comecei a ler. Chegou uma menina na outra ponta. Determinados textos funcionam como uma bebida, ou um alimento, depende de qual é a sua fome. Olhei ao redor e ninguém estava se “alimentando”, todos pareciam concentrados em entender algo. Vi que estava no meio dos concurseiros. Uma menina linda e entediada à esquerda. Um bombado tentando se concentrar. Uma menina de cabelo cacheado do outro lado da minha mesa. O ventilador no máximo. Eu era o único que não estava estudando. Me senti bem. Eles estavam com o semblante triste. Decerto a leitura pra eles significa apenas estudar. E ler não é só isso, ler é um papo consigo mesmo usando palavras que não são suas, é uma forma de você poder escutar a sua voz com os sentimentos impressos ali. E só um cara fazendo isso numa biblioteca praticamente cheia? O que esta acontecendo com a leitura? Até quando as bibliotecas só vão ter estudantes? Cadê as pessoas que querem se embebedar com os livros? Não tenho nenhuma dúvida de que sempre estive certo: a leitura não tem nada haver com a proposta da escola. A literatura corrompe. E pelo visto os livros que gritam nas estantes, ou aqueles que nos fazem rir, chorar, e ter raiva já estão a caminho da extinção. Os tristes concurseiros já influenciam em quais livros devem estar nas prateleiras.  Então resolvi fazer um ato “terrorista”. Antes de ir embora ajeitei os 8 exemplares de forma que eles ficassem espalhados na mesa. Como um voyeur queria ver se alguém ao sentar ali iria folheá-los, ou até mesmo ler um pouco, mas depois que levantei preferi ir embora. Quando já estava na porta quis virar discretamente pra dá uma olhada, mas não fiz isso. Quem folheou aquelas páginas? Nunca vou saber. Às vezes a imaginação é melhor do que a realidade. 

segunda-feira, 2 de julho de 2012